sábado, 21 de maio de 2016

No crédito ou no débito?


      Tenho cinco pares de tênis. Não que eu precise de cinco pares de tênis. Afinal, só posso usar um par por vez. Mas todas as vezes em que vejo tênis parecidos com os meus, fico com vontade de comprá-los e mais que isso, me sinto rodeada dessa vontade por alguns dias, até que consiga esquecer os tênis e ter vontade de comprar uma outra coisa. Vivo pela necessidade de possuir as coisas, geralmente coisas das quais não preciso,  assim como grande parte da população. Somos consumidos pelo consumismo.
      Marcas, preços, parcelas de pagamento, lojas, essas são as coisas que nos fazem estudar durante mais de 15 anos e trabalhar durante mais de 30, sem nem questionar. Ficamos cansados, irritados e muitas vezes, nem mesmo gostamos daquilo que fazemos, mas continuamos fazendo, para em algum momento do mês, pagar as contas e comprar as tão sonhadas coisas das quais não necessitamos. Mas, de verdade, não acho que isso seja completamente nossa culpa.
      Vivemos o tempo da internet, onde ter um celular no bolso e uma televisão em casa é algo corriqueiro. Por isso mesmo é que estamos tão sujeitos à manipulação. A propaganda está lá, nos programas televisivos, nas redes sociais, nas roupas dos artistas, até nas promoções. Está infiltrada no mais profundo do inconsciente, praticamente desde o dia em que nascemos. Ela nos impele mais e mais a cada dia, a digitar a senha do cartão de crédito.
      E as estratégias de propaganda só evoluem. O que antes era claro, óbvio, mostrando o produto como algo a ser comprado,  oferecendo descontos, hoje é completamente subjetivo. Você não precisa comprar, não vai ter desconto, não sabe o valor do produto, mas deveria pesquisar sobre ele, descobrir onde pode comprar e ir até esse local logo, pois com certeza será mais feliz, bonita e bem sucedida se fizer isso.
      Qual o tamanho do absurdo?  Comprar um vestido de 500 reais, feito do mesmo material de um vestido de 100, por conta do nome na etiqueta, ou comprar um vestido de 100 quando você possui outras dezenas de vestidos novos? Fazemos os dois. Mais que manipulados, nós abraçamos o consumismo, aceitamos a ilusão de necessidade dos produtos e valorizamos as marcas. Afinal, se não comprarmos, fazendo uma propaganda indireta, o produto tem seu valor de mercado reduzido, é a lei da oferta e da procura. Nós fazemos das marcas o que elas são, não o contrário.
      O mais preocupante da situação é que estamos presos num ciclo vicioso. Somos impelidos a comprar porque temos a sensação de que aquilo que possuímos não é o bastante, está ultrapassado, precisa ser substituído. E é exatamente essa a intenção. O mercado quer que seu produto seja algo frágil e ultrapassado, ou ao menos, que você pense nele dessa forma. Lançam versões supostamente atualizadas, mas que são quase iguais ao que você tem em casa e te fazem comprar aquele produto, no pensamento de que ele vai realmente fazer a diferença na sua vida. Seis meses depois, a mesma coisa.
      Vivemos num mundo onde trabalhar para comprar e comprar para ser feliz é regra, quase um lema do subconsciente. Afinal, é isso que constitui o capitalismo. É essa vontade de possuir, essa necessidade de trabalhar para possuir que move nossa sociedade.
E talvez seja uma das coisas mais difíceis de fazer, mas conter essa necessidade de compra, pensar sobre o custo e os reais benefícios que aqueles produtos podem te trazer, muda sua visão da vida, ao menos um pouco. Ser um comprador consciente pode te fazer não só economizar, mas perceber o ciclo vicioso em que vivemos, perceber que trabalhar de forma exacerbada e infeliz para ter poder de compra não é algo saudável.
       Ser compradores conscientes poderia, então, finalmente mudar nosso lema para algo minimamente diferente de “trabalhar para comprar e comprar para ser feliz”. E isso, mesmo que “minimamente” não inspire confiança, já causaria uma mudança considerável naquilo que somos e na forma como nos comportamos em sociedade.

Beatriz T. Figueiredo 

Um comentário:

  1. Evito mesmo conjugar o verbo "comprar". Rsrs Parabéns pelo texto consistente.

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